quarta-feira, 23 de julho de 2014

Book Haul - Junho '14


     Junho é meu mês favorito do ano e esse ano foi o mês mais descontrolado no quesito aquisição de livros também. Quando parei para contabilizar o estrago decidi ficar pelo menos um mês sem comprar nada e estou quase alcançando a meta (só vou abrir uma pequena exceção pro livro novo do Milan Kundera, mas é só, JURO). E vários dos livros foram presentes porque junho é o mês do meu aniversário :)




 




     Bom, decidi não falar de livro por livro porque acho que ninguém teria paciência, né? Vários são das promoções que a Companhia das Letras e a Editora 34 fizeram esse mês e alguns outros são aproveitando o desconto para aniversariante da Cosac Naify. E uma boa quantidade também são livros que ganhei de presente :) Como vocês podem ver, junho foi um mês excelente para minha estante.

     É isso, pessoal, até mais e boas leituras!

segunda-feira, 21 de julho de 2014

A fantástica vida breve de Oscar Wao, Junot Díaz

Título: A fantástica vida breve de Oscar Wao
Autor: Junot Díaz
Tradutor: Flávia Anderson
Edição: São Paulo: Record, 2009. 1ª edição.

         A fantástica vida breve de Oscar Wao é o primeiro romance de Junot Diaz – cuja estréia literária foi  o livro de contos Afogado – e pelo qual o autor recebeu o prêmio Pulitzer em 2008. De origem dominicana, Junot Díaz imigrou ainda jovem para os Estados Unidos e hoje é professor do famoso MIT (Massachussets Institute of Technology).
            Apesar de Oscar ser o personagem central e acompanharmos, como o título já indica, sua breve vida do ínicio ao fim, também são explorados os outros membros mais importantes de sua família – a mãe, a irmã Lola e sua avó, La Inca, que mora na República Dominicana em uma narrativa que divide-se em duas partes.
            Oscar é apresentado no primeiro capítulo: uma criança que conforme se desenvolve torna-se mais deslocado no mundo. Criado em uma comunidade de imigrantes, ele sofre por não conseguir se identificar com o esterétipo do latino. Gordo, nerd, solitário, tímido e terrivelmente romântico, Oscar tropeça pela vida e acaba encontrando uma paixão. A moça é colega de sala do cursinho onde Oscar estuda para sua segunda tentativa no exame de ensino médio americano, o SAT. A primeira desilusão amorosa alimenta sua vontade de encontrar na escrita um refúgio.
O segundo capítulo apresenta uma oscilação de narrador – ora usa-se a primeira pessoa, ora a terceira – o que, segundo o autor, é indicação de que o narrador estabelecido ao longo do livro, o dominicano Yunior, amigo de Lola e mais tarde Oscar, é quem de fato narra simulando o ponto de vista de sua amiga e ex-namorada. Lola vive em conflito constante com sua mãe, uma mulher antiquada que abusa fisica e psicologicamente da menina. Desesperada, decide fugir de casa para morar com o namorado, mas logo é resgatada pela mãe e mandada para a República Dominicana, onde mora com La Inca por uns tempos.
Temos, a seguir, um capítulo dedicado às histórias de origem de Belícia, mãe de Oscar e Lola. É revelado um passado de abusos e abandonos, até que a menina é resgatada por La Inca, uma parente distante que, incapaz de ter filhos, resolve procurar todos os parentes ainda vivos em meio a destruição da sociedade dominicana causada pela ditadura militar. Belícia é jovem impetuosa e, após uma desilusão amorosa durante a idade escolar, envolve-se com um gangster. Recusa-se a aceitar que não há destino para os dois e acaba engravidando somente para mais tarde descobrir que ele é casado com a irmã do ditador Trujillo. É dada a ordem para execução silenciosa de Beli. Milagrosamente, consegue sair com vida do canavial onde foi surrada e após recuperar-se, vai para os Estados Unidos onde constrói para si uma vida simples e marcada pelo trabalho pesado.
            O quarto descortina de vez o narrador que até então comentava a narrativa sem colocar-se como personagem. Ele é amigo de longa data de Lola, decide ser colega de quarto de Oscar para agradá-la. Atlético e mulherengo, Yunior decide “reformar” Oscar, mas acaba desistindo da missão e abandonando aos poucos a amizade com o irreparável nerd – apesar de não admitir abertamente, Yunior compartilha, embora com menor intensidade, os intesesses de Oscar e preocupa-se com o rapaz.
            Com os personagens centrais estabelecidos, acompanhamos as desventuras de Oscar até sermos apresentadas a que acaba por ser a final – sua paixão por uma prostituta amante de um dos generais da polícia dominicana, o que o coloca em perigo semelhante ao que sua mãe enfrentou anos atrás.
            A história da República Dominicana é presença forte em A fantástica vida breve de Oscar Wao, revelada seja pela narrativa, que demonstra a destruição do país e as cicatrizes deixadas de geração para geração, seja pelas surpreendentemente bem humoradas notas de roda pé escritas ainda no estilo do narrador e que comparam frequentemente Trujillo, o ditador, aos grandes vilões da cultura nerd – em especial, são feitas muitas referências à obra de Tolkien. Em ritmo acelerado e com uma escrita envolvente, Diaz discute os horrores das ditaduras financiadas pelos americanos que fizeram parte da história de vários países latino-americanos, a experiência da imigração e a identidade dominicana. O romance capta brilhantemente a força que move seus personagens em situações impossíveis – o instinto de sobrevivência da família de Oscar (e de todos os imigrantes), estranhamente envigorado por um impulso autodestrutivo.
Lola, mais próxima de La Inca do que de sua mãe, parece ser  única disposta a quebrar o ciclo (ou, como os dominicanos diriam, o fukú) da família e o desfecho indica alguma esperança de que finalmente consiga por meio da educação que sua mãe, personagem fascinante em sua complexidade, a garantiu e que agora lhe permite criar sua filha, Ísis, de forma mais consciente. 

Nota:

sábado, 12 de julho de 2014

Oranges are not the only fruit, Jeanette Winterson

Título: Oranges Are Not The Only Fruit
Autora: Jeanette Winterson
Edição: Grove Press, 1997.

        Jeanette Winterson é autora britânica conhecida principalmente pelo romance Oranges are not the only fruit. A obra foi adaptada para a televisão pela BBC e recebeu bastante destaque, além de arrebatar um BAFTA. A autora, por sua vez, também foi reconhecida por diversos prêmios e pertence a Order of British Empire por suas contribuições literárias ao país.
Com fortes tendências autobiográficas, Oranges are not the only fruit acompanha a vida de sua protagonista, Jeanette, da infância até a adolescência. Filha adotiva de um casal formado por uma cristã fervorosa e fundamentalista profundamente envolvida com a comunidade evangélica de sua cidade e um pai ausente, desde criança faz parte da congregação e é totalmente controlada por sua mãe, que também a educa em casa até os sete anos, quando recebe intimação para matriculá-la na escola.
A influência materna ainda prevalece e Jeanette sente-se deslocada dentro do ambiente escolar onde seu extenso conhecimento biblíco causa estranhamento e receio de colegas e professores. A igreja ainda é o lugar em que se sente em casa e, obedecendo aos desejos da mãe, estuda para tornar-se uma jovem missionária cristã. Apesar de sua lealdade, com a chegada da adolescência Jeanette vai percebendo que discorda de alguns pontos da doutrina que recebe, além de não simpatizar com o pastor famoso que sua congregação recebe. Percebe, também, que para os outros seu universo é estranho e o relacionamento com sua rígida mãe torna-se progressivamente mais difícil.
            Certo dia Jeanette conhece uma jovem na cidade e sente-se imediatamente fascinada por ela. A amizade entre as duas é imediata e Melanie passa a frequentar a igreja também. O relacionamento amoroso entre as duas lhes parece uma progressão natural, embora saibam que devem manter tudo em segredo. Quando descobertas, as jovens separam-se e Jeanette recebe traumático tratamento de sua família e comunidade, incluindo uma sessão de exorcismo em que é presa em um cômodo por trinta e seis horas sem comida. Jeanette finge arrepender-se e, com Melanie longe, dedica-se intensamente ao trabalho na Igreja – uma vez que sua habilidade linguística faz com que colha bons resultados, além de permitir que se sinta segura no ambiente predominante feminino em que cresceu.
Agora mais velha e longe da escola, com a igreja como sua principal obrigação, Jeanette sente-se satisfeita. Começa novo relacionamento com uma recém-convertida, Katy, e dessa vez procura manter o segredo com maior cuidado. No entanto, é descoberta e a congregação, incitada pelo pastor, decide que o problema é o proeminente papel exercido pelas mulheres da comunidade e que a atuação feminina deve ser limitada. Inconformada, finalmente decide abandonar sua casa e desligar-se da igreja. Arranja um emprego e começa a economizar para ir para Londres, lugar que idealiza como uma nova possibilidade.
            Narrado em primeira pessoa, o livro explora o impressionante impacto dos mitos bíblicos na mente jovem de Jeanette. Sua imaginação é toda ditada pelas estruturas narrativas e personagens que povoam essses textos que estuda com tanto afinco desde a infância. Os capítulos são nomeados segundo livros da bíblia que dialogam, na maioria das vezes pelo contraste, com o momento pelo qual a personagem central passa. O quinto capítulo, que ocupa posição central no livro, rompe de forma interessante com a narrativa estabelecida e apresenta um narrador – que não é a Jeanette-personagem – discutindo os conceitos de fato e ficção e como a história do passado individual de cada um é produto de ambos: não só dos fatos, mas também como eles foram por nós interpretados e pela forma que construímos nossas narrativas.
            Além do trabalho formal extremamente bem executado e reflexivo, a prosa de Winterson acompanha bem o desenvolvimento de sua personagem, dosando a influência do discurso religioso conforme o estado de sua heroína. Uma das principais características de Jeanette é sua eloquência, ferramenta usada tanto para o serviço da igreja quanto, mais tarde, para seu proveito próprio.
            Oranges are not the only fruit explora competentemente temas profundos em um número surpreendentemente pequeno de páginas: a religião, o papel feminino na sociedade, a morte, o preconceito sofrido pela comunidade LGBT e a própria natureza das histórias são abordadas de forma interessante e que revelam intenso cuidado da autora, resultando em uma obra executada brilhantemente.

Nota: ♥♥♥♥