sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Estorvo, Chico Buarque de Hollanda

Título: Estorvo
Autor: Chico Buarque de Hollanda
Editora: Record/Altaya
Edição: Coleção Mestres da Literatura Brasileira e Portuguesa, 1998.

          Estorvo é o romance de estreia do compositor Chico Buarque, publicado pela primeira vez em 1991 e recebido positivamente pela crítica que premiou-o com um prêmio Jabuti de melhor romance.
       Narrado em primeira pessoa, Estorvo, acompanha seu personagem anônimo em suas ações durante uma fuga causada por um rosto misterioso que ele vê em seu olho mágico e que o perturba a ponto de decidir fugir e evitar sua própria casa. A partir desse momento o leitor percebe que terá que decifrar as informações fragmentadas que o fluxo de pensamento do personagem nos oferece sem quase nenhuma linearidade temporal. O autor tira proveito máximo desse recurso para cercar sua narrativa de uma atmosfera onírica, fazendo com que a dúvida paire no ar.
            A busca por um lugar seguro acaba como uma busca por lugares femininos – as duas principais relações mantidas pelo personagem são com sua irmã e sua ex-mulher e o apartamento de sua mãe é retomado constantemente, apesar de se apresentar sempre indisponível. Ambas as mulheres que são de fato presentes em sua vida o aceitam como se aceita alguém incapaz de cuidar de si mesmo e é essa a principal impressão que o personagem deixa em seu leitor.
            Suas ações são gratuitas, movidas pela inspiração do acaso. Suas consequências, no entanto, são reais – existe uma oscilação entre o que diz respeito ao narrador e aos personagens secundários que insinua essa distinção. Talvez essa seja a maior falha do livro: falta algo que ancore a narrativa ou pelo menos seu personagem principal que é mais do que mero estorvo para os que estão ao redor: fica difícil acreditar que suas ações não tenham nunca peso quando elas acarretam consequências tão graves para aqueles ao seu redor. Ou será que suas ações não tem peso e ele só deseja que assim seja, perdido em seus pensamentos?
            Apesar da narrativa insatisfatória em si mesma, o uso de recursos linguísticos faz com que a leitura seja agradável. A prosa marcada pela individualidade não-individual de seu narrador que é ninguém e qualquer um é  bem construída e mantida durante o livro todo por meio de uma prosa simples. Essa construção condiz harmonicamente com seu narrador que em diversos momentos devaneia hipóteses, constrói cenário e os abandona bruscamente – assim como parece abandonar tudo mais que o rodeia, porém sem que isso deixe de acrescentar ao todo uma nova informação. É nessa realização que está o alicerce do incerto romance de Chico Buarque que cumpre o que propõe desde o começo: não dar respostas ao seu leitor, perdido na perturbação de seu estorvo.

Nota: ♥♥♥

            

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