Autor: Chico Buarque de Hollanda
Editora: Record/Altaya
Edição: Coleção Mestres da Literatura Brasileira e Portuguesa, 1998.
Estorvo
é
o romance de estreia do compositor Chico Buarque, publicado pela primeira vez
em 1991 e recebido positivamente pela crítica que premiou-o com um prêmio
Jabuti de melhor romance.
Narrado
em primeira pessoa, Estorvo,
acompanha seu personagem anônimo em suas ações durante uma fuga causada por um
rosto misterioso que ele vê em seu olho mágico e que o perturba a ponto de
decidir fugir e evitar sua própria casa. A partir desse momento o leitor
percebe que terá que decifrar as informações fragmentadas que o fluxo de
pensamento do personagem nos oferece sem quase nenhuma linearidade temporal. O
autor tira proveito máximo desse recurso para cercar sua narrativa de uma
atmosfera onírica, fazendo com que a dúvida paire no ar.
A busca
por um lugar seguro acaba como uma busca por lugares femininos – as duas
principais relações mantidas pelo personagem são com sua irmã e sua ex-mulher e
o apartamento de sua mãe é retomado constantemente, apesar de se apresentar
sempre indisponível. Ambas as mulheres que são de fato presentes em sua vida o aceitam
como se aceita alguém incapaz de cuidar de si mesmo e é essa a principal
impressão que o personagem deixa em seu leitor.
Suas
ações são gratuitas, movidas pela inspiração do acaso. Suas consequências, no
entanto, são reais – existe uma oscilação entre o que diz respeito ao narrador
e aos personagens secundários que insinua essa distinção. Talvez essa seja a
maior falha do livro: falta algo que ancore a narrativa ou pelo menos seu
personagem principal que é mais do que mero estorvo para os que estão ao redor:
fica difícil acreditar que suas ações não tenham nunca peso quando elas
acarretam consequências tão graves para aqueles ao seu redor. Ou será que suas
ações não tem peso e ele só deseja que assim seja, perdido em seus pensamentos?
Apesar
da narrativa insatisfatória em si mesma, o uso de recursos linguísticos faz com
que a leitura seja agradável. A prosa marcada pela individualidade
não-individual de seu narrador que é ninguém e qualquer um é bem construída e mantida durante o livro todo
por meio de uma prosa simples. Essa construção condiz harmonicamente com seu
narrador que em diversos momentos devaneia hipóteses, constrói cenário e os
abandona bruscamente – assim como parece abandonar tudo mais que o rodeia,
porém sem que isso deixe de acrescentar ao todo uma nova informação. É nessa
realização que está o alicerce do incerto romance de Chico Buarque que cumpre o
que propõe desde o começo: não dar respostas ao seu leitor, perdido na
perturbação de seu estorvo.
Nota: ♥♥♥
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