Título: Passeio ao farol
Autora: Virginia Woolf
Tradução: Luiza Lobo
Editora: Nova Fronteira
Edição: Rio de Janeiro, 1987
Passeio ao farol (em algumas traduções, Rumo ao farol) é um romance escrito pela
autora britânica Virginia Woolf, um dos maiores nomes do Modernismo cuja
extensa obra de ficção e não-ficção é um dos marcos literários do século XX.
Publicado
em 1927, dois anos após o famoso romance
Mrs Dolloway,
Passeio ao farol
compartilha da mesma precisão técnica da obra anterior, porém explorada de
novas formas. Enquanto
Mrs Dolloway
possui estrutura mais rígida – a narrativa se passa em um só dia e tudo que é
descrito gravita em torno da personagem que lhe dá nome –
Passeio ao farol afrouxa essas amarras. Aqui temos como constante
somente o espaço: a casa de praia dos Ramsay e os personagens que a habitam. Já
quanto ao tempo, a narrativa é dividida em três partes que marcam divisões do
livro: “A janela”, “O tempo passa” e “O farol”.
A primeira
parte introduz os Ramsay, uma família formada pelo pai, o Sr. Ramsay,
intelectual rígido, introvertido e obcecado com suas próprias realizações; a
Sra Ramsay, bela, compreensiva e amada por todos na família, porém vista como
um pouco distante e fria pelas pessoas de fora; oito filhos, entre eles Prue, a
menina mais velha que é tão bela quanto a mãe, Andrew, o irmão mais velho, e o
menino mais novo e mais próximo da mãe, James. Além dos Ramsay, fazem parte da
narrativa alguns amigos da família que acompanham a viagem, como os jovens
apaixonados Paul e Minta e a solteirona Lily Briscoe.
A Sra
Ramsay deseja, para agradar especialmente seu filho mais novo, visitar o farol
que podem observar da casa de praia. A viagem exige que todos peguem um barco e
o Sr Ramsay logo se recusa, afirmando que o clima está instável. A ação não é,
entretanto, a principal ocupação do romance de Woolf. Em torno desses
acontecimentos a autora lança mão da mudança de foco narrativo e do uso do
fluxo de consciência para esmiuçar os sentimentos, impressões e sensações que
fazem parte da vida doméstica dos Ramsay e os efeitos desse pequeno atrito entre
o casal. Esse é, talvez, o grande tema de Passeio
ao Farol: o universo interior escondido pela banalidade do cotidiano.
A personagem de Lily Briscoe e
sua obsessão com a pintura de um quadro retratando a paisagem, em que a
silhueta de uma distante Sra Ramsay aparece na janela trazem outro tema interessante
explorado por Woolf: a preocupação com a perspectiva, com a representação fiel
e o constante questionamento de Lily adicionam um interessante comentário sobre
a relação entre criador e obra e como a visão do artista é determinante na hora
de traçar um retrato.
A segunda
parte, “O tempo passa”, traz uma ruptura da narrativa até então estabelecida e
toma lugar na casa de praia abandonada e em péssimas condições, além de
introduzir, com a ajuda de um narrador onisciente, a passagem de dez anos e
suas consequências – as mortes da Sra Ramsay, Prue e Andrew ecoam as perdas de
uma Europa pós-primeira guerra mundial (motivo da morte do primogênito dos
Ramsay). A casa em ruínas é arrumada, mas é impossível restaurá-la ao que foi.
Por fim, “O
farol” traz os personagens remanescentes realizando finalmente a viagem ao
Farol. A harmonia familiar que era mantida graças à dinâmica entre a Sra e o Sr
Ramsay está destruída e o ambiente doméstico é agora um lugar nocivo, em que os
filhos, especialmente James, buscam resistir à tirania paterna. A chegada ao
farol acaba por provar-se anticlimática, especialmente para James, que era quem
a mais desejava. Ao longe, Lily observa com esforço o barco e depois termina
sua pintura, finalmente satisfazendo-se com a execução de sua visão artística.
A divisão
do livro em três partes, todas realizando cortes bruscos na narrativa
amplificam as impressões que os episódios narrados – a viagem dos Ramsay
juntos, a limpeza da casa, a viagem ao farol – causam isoladamente,
especialmente reforçando a sensação de estranhamento em relação à passagem do
tempo. Passeio ao farol traz uma
prosa rica e delicada combinada a uma precisão técnica meticulosa e bem
refletida, explorando as complexas relações humanas e a inexorabilidade do
tempo e da vida mediante os planos humanos. A obra alcança um equilíbrio
harmonioso e artístico impressionante justamente por ser não só eficiente, mas
também de uma beleza lírica única.
Nota: ♥♥♥♥♥