segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Passeio ao farol, Virginia Woolf

Título: Passeio ao farol
Autora: Virginia Woolf
Tradução: Luiza Lobo
Editora: Nova Fronteira
Edição: Rio de Janeiro, 1987

            Passeio ao farol (em algumas traduções, Rumo ao farol) é um romance escrito pela autora britânica Virginia Woolf, um dos maiores nomes do Modernismo cuja extensa obra de ficção e não-ficção é um dos marcos literários do século XX.
            Publicado em 1927, dois anos após o famoso romance Mrs Dolloway, Passeio ao farol compartilha da mesma precisão técnica da obra anterior, porém explorada de novas formas. Enquanto Mrs Dolloway possui estrutura mais rígida – a narrativa se passa em um só dia e tudo que é descrito gravita em torno da personagem que lhe dá nome – Passeio ao farol afrouxa essas amarras. Aqui temos como constante somente o espaço: a casa de praia dos Ramsay e os personagens que a habitam. Já quanto ao tempo, a narrativa é dividida em três partes que marcam divisões do livro: “A janela”, “O tempo passa” e “O farol”.
            A primeira parte introduz os Ramsay, uma família formada pelo pai, o Sr. Ramsay, intelectual rígido, introvertido e obcecado com suas próprias realizações; a Sra Ramsay, bela, compreensiva e amada por todos na família, porém vista como um pouco distante e fria pelas pessoas de fora; oito filhos, entre eles Prue, a menina mais velha que é tão bela quanto a mãe, Andrew, o irmão mais velho, e o menino mais novo e mais próximo da mãe, James. Além dos Ramsay, fazem parte da narrativa alguns amigos da família que acompanham a viagem, como os jovens apaixonados Paul e Minta e a solteirona Lily Briscoe.
            A Sra Ramsay deseja, para agradar especialmente seu filho mais novo, visitar o farol que podem observar da casa de praia. A viagem exige que todos peguem um barco e o Sr Ramsay logo se recusa, afirmando que o clima está instável. A ação não é, entretanto, a principal ocupação do romance de Woolf. Em torno desses acontecimentos a autora lança mão da mudança de foco narrativo e do uso do fluxo de consciência para esmiuçar os sentimentos, impressões e sensações que fazem parte da vida doméstica dos Ramsay e os efeitos desse pequeno atrito entre o casal. Esse é, talvez, o grande tema de Passeio ao Farol: o universo interior escondido pela banalidade do cotidiano.
A personagem de Lily Briscoe e sua obsessão com a pintura de um quadro retratando a paisagem, em que a silhueta de uma distante Sra Ramsay aparece na janela trazem outro tema interessante explorado por Woolf: a preocupação com a perspectiva, com a representação fiel e o constante questionamento de Lily adicionam um interessante comentário sobre a relação entre criador e obra e como a visão do artista é determinante na hora de traçar um retrato.
            A segunda parte, “O tempo passa”, traz uma ruptura da narrativa até então estabelecida e toma lugar na casa de praia abandonada e em péssimas condições, além de introduzir, com a ajuda de um narrador onisciente, a passagem de dez anos e suas consequências – as mortes da Sra Ramsay, Prue e Andrew ecoam as perdas de uma Europa pós-primeira guerra mundial (motivo da morte do primogênito dos Ramsay). A casa em ruínas é arrumada, mas é impossível restaurá-la ao que foi.
            Por fim, “O farol” traz os personagens remanescentes realizando finalmente a viagem ao Farol. A harmonia familiar que era mantida graças à dinâmica entre a Sra e o Sr Ramsay está destruída e o ambiente doméstico é agora um lugar nocivo, em que os filhos, especialmente James, buscam resistir à tirania paterna. A chegada ao farol acaba por provar-se anticlimática, especialmente para James, que era quem a mais desejava. Ao longe, Lily observa com esforço o barco e depois termina sua pintura, finalmente satisfazendo-se com a execução de sua visão artística.
            A divisão do livro em três partes, todas realizando cortes bruscos na narrativa amplificam as impressões que os episódios narrados – a viagem dos Ramsay juntos, a limpeza da casa, a viagem ao farol – causam isoladamente, especialmente reforçando a sensação de estranhamento em relação à passagem do tempo. Passeio ao farol traz uma prosa rica e delicada combinada a uma precisão técnica meticulosa e bem refletida, explorando as complexas relações humanas e a inexorabilidade do tempo e da vida mediante os planos humanos. A obra alcança um equilíbrio harmonioso e artístico impressionante justamente por ser não só eficiente, mas também de uma beleza lírica única. 

Nota: ♥♥♥♥♥

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