Autor: Jean Rhys
Edição: Penguin Books, 2000.
Wide Sargasso Sea foi publicado pela primeira vez em 1939 por Jean
Rhys. A obra foi o resultado de anos de trabalho e conseguiu boa recepção de
público e crítica. O romance serve como prólogo para a obra Jane Eyre, clássico da autora britânica
Charlotte Brontë. Wide Sargasso Sea funciona
também independentemente, porém o cuidado da autora para que a sequência de
eventos de uma obra possa realmente dar origem à outra, além do fato de se
debruçar sobre as origens de uma das personagens tipo mais interessantes da
Literatura, conhecida como the mad woman
in the attic – em uma tradução livre, a
mulher louca em um porão – permitindo-lhe ter voz dentro da narrativa fazem
com que o romance de Jean Rhys só se beneficie pela leitura prévia do clássico
de Brontë.
O
enredo conta a história de Antoinette desde sua infância nas fazendas de sua
família situada na Jamaica. Após abolição da escravidão, os Cosway enfrentam
uma situação precária que só não é crítica graças aos funcionários que se recusam a abandonar a fazenda mesmo com a possibilidade de liberdade. A família encontra-se em péssimas condições
financeiras, em especial após a morte do patriarca causada pela excessos com
álcool.
A
mãe de Antoinette não consegue cuidar sozinha da família – que conta também com
Pierre, um menino de saúde extremamente frágil – pois além de não possuir meios
sequer para cuidar de si mesma, é ignorada pela elite branca da cidade. Os
locais, por sua vez, também hostilizam os Cosway. A infância de Antoinette é
marcada pela solidão e sensação de rejeição.
A
vida dos Cosway começa a mudar quando Anette conhece Sr. Mason, homem rico que
se encanta por ela e a pede em casamento. A vida na fazenda passa a ser mais
confortável e um breve período de paz acontece. Apesar disso, Sr. Mason é uma
figura opressiva que se recusa a ouvir opiniões dos outros. As tensões na
região começam a crescer e a população negra torna-se progressivamente mais
agressiva em relação aos brancos, porém Mason ignora os perdidos da mulher e
decide ficar.
A
situação torna-se insustentável quando as promessas de violência tornam-se realidade.
A propriedade em que Antoinette cresceu é incendiada e a família escapa por um
triz – porém, não sem consequências. Pierre não sobrevive, Anette perde o
controle e enlouquece e a pequena Antoinette pede para ficar na Jamaica, em um
internato, enquanto Mason decide finalmente partir para Inglaterra.
Lá
Antoinette passa a adolescência. O ambiente austero e rígido torna-se, pouco a
pouco, um lugar de segurança para a menina, em especial pela possibilidade de
isolamento que traz. Seu padrasto só exige seu retorno quando a moça alcança a
idade de casamento.
Aos
dezessete anos, depois de uma vida marcada por eventos traumáticos e isolamento
quase total, Antoinette hesita. Seu casamento é arranjado por interesses
financeiros de ambas as partes e a enche de terror, mas poucas são as
possibilidades para uma moça em sua situação e só lhe resta aceitar.
O
relacionamento com seu marido é marcado, novamente, pela sensação de rejeição.
O jovem inglês estranha a região, a casa, os funcionários... e acaba, por fim,
também alienando sua esposa. Antoinette fica perdida, desejando pelos primeiros
dias de casamento em que para seu marido bastava-lhe sua beleza. A jovem começa
a ressentir, em especial, a insistência de seu esposo de chamá-la de Bertha,
nome dado sem explicações.
Após
uma discussão agressiva, Antoinette é levada para a Inglaterra, onde passa a
ser tratada como louca e isolada totalmente. Aos poucos, a razão começa a
escapar-lhe, porém o desejo de fuga mantém-se firme, culminando no incêndio da
mansão de Rochester que acontece em Jane
Eyre.
O
período histórico e cenário do romance amplificam a sensação inerente de
Antoinette de não pertencer a nada. Vista como uma estranha tanto para as
pessoas da região quanto para os britânicos, abandonada desde pequena pelos
pais e uma estranha para o próprio marido, a jovem é predestinada a falhar em
comunicar seus desejos – Antoinette quer, mas não consegue, demandar amor e
compreensão das pessoas com quem convive – o que resulta na loucura. A
infância, a estrutura social, a instituição da Igreja e do casamento silenciam
cada vez mais a jovem.
Como
Antoinette é também a principal narradora, as consequências de seu isolamento
são refletidas pelo seu recontar dos fatos que vai se tornando progressivamente
mais turvo conforme a narrativa avança e seu isolamento se intensifica. Também
são narradores Rochester, que oferece a visão do estrangeiro da região, seus
costumes, hábitos e mesmo modo de falar e, por fim, Grace Poole, empregada responsável por cuidar de Antoinette
na Inglaterra.
Wide Sargasso Sea parte de uma proposta
que oferece mais fracassos do que sucessos à Literatura – imaginar o passado de
um personagem já inventado – porém é bem sucedido graças ao tom acertado e
escolhas interessantes de sua autora. A atmosfera opressora contrasta
perfeitamente com as ensolaradas e abertas paisagens jamaicanas, culminando na
ida para a sombria Londres. Profunda reflexão sobre a condição feminina na
sociedade e as questões raciais e de classe pós-colonialistas, é um romance que
vale a si mesmo e, acertadamente, foge à superficialidade que a trama poderia
ganhar em mãos menos talentosas.
Nota: ♥♥♥♥
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